Velhos do Restelo

Escrevo hoje sobre um tema que diariamente me vem à cabeça sempre numa mistura de irritação e impotência, não sobre o personagem camoniano mas sobre a sua presença quotidiana na vida de todos nós.

O Velho do Restelo está vivo e infelizmente de boa saúde. Ser Velho do Restelo é quase sinónimo de Ser Português e isto é um facto que me deixa acima de tudo triste, triste por viver num país assim.

Quem foi o Velho do Restelo ?

O Velho do Restelo é uma personagem de Camões no célebre Os Lusíadas que representava simbolicamente aqueles que da nossa sociedade de então se opunham aos Descobrimentos, à nossa cavalgada por 'mares nunca dantes navegados'.

Aqueles de nós que ainda se recordam de tal personagem (e não somos assim tantos, embora na blogosfera certamente estamos em maioria) na altura pouco lhe ligaram porque nossos mestres (professores), como nós, à posteriori não entendemos como alguém se pode opor a tais feitos, 'novos mundos ao mundo'. Mas na verdade as coisas são bem mais complexas e não sou eu a pessoa que as pode esmiuçar, mas dou a minha colaboração.

Quem não ouviu já as seguintes palavras 'Eu não te avisei?'
para mim é a pior coisa que me podem dizer, e estou mesmo a ser sincero. mas ser aventureiro é assim mesmo, não sei se é inveja se é apenas espertice, mas quem quer ir contra a corrente tem de pagar o preço.

na verdade, agora como naqueles tempos, não são (apenas) razões altruistas que levam uma pessoa a querer ir onde outras não vão. vejam-se os actuais descobrimentos - a conquista espacial. sim senhor, ela la vai, ora devagar ora devagarinho. desde os anos 70 que o investimento caiu muito (digo eu) e entende-se porquê - os objectivos que podiam ser atingidos a relativamente curto prazo foram atingidos, o homem pisou a Lua.

mas porque pisou o homem a Lua ? pelas mesmas razões que foi até à India de barco ?

o homem pisou a Lua apenas porque ainda ninguem o tinha feito porque nada de bom (nem de mau) adveiu disso, gastou-se uma data de dinheiro.. desenvolveu-se a ciencia e a tecnologia.. mas para que precisamos nós de tais feitos ?

e porque precisavam eles de ir de barco à India ?

não fomos lá nós pelas mesmas razões que os americanos à Lua ?

foi só pra dizermos que podiamos, que somos melhor que eles (espanhois/russos) ?

e não é uma excelente razão ? bom, agente ainda trazia de la especiarias - outra coisa que nunca percebi muito bem.. então agente vai pa tão longe, sujeitos a morrer tantos de nós só por causa duns pozinhos pa por na comida ?

a verdade é que tamos muito mal habituados, agora até as iguarias do Japão ao Chile se podem encontrar em qualquer cidade nos restaurantes por aqui e por ali, mas naqueles tempos, era mesmo só peixe e carna podre semsaborona, que com aquela pitada de gengibre, pimenta e nós moscada lhes sabia a mel. e nem conheciam eles ainda o alho moído.

a mim, a ti e a outros como nós que querem ser diferentes eu faço esta pergunta: o que fazer com estes Novos-Velhos do Restelo ? especialmente quando são nossos amigos, nossos pais, nossos colegas..

é que falar é facil, certamente pensamos todos 'eu cá mando-os à fava.. sigo o meu caminho digam o que disserem'. mas é de pessoas que estamos a tratar, gente como eu e tu, mas com outra maneira de ver o mundo, que não procuram transformar o que está mal mundo e aproveitar-se disso, ser como os outros, aqueles que são espertos.. espertinhos..

de vez em quando gosto de fazer esta reflexão para não me esquecer que cada vez que ouvir 'tu é que sabes' a preparar um 'eu não te disse' é uma oportunidade de calar alguém, e é aí que ponho mais empenho, vontade e determinação naquilo que faço.

certamente que a velhice do restelo não reside apenas na 'ocidental praia lusitana' mas ela está por aqui bem entranhada. tenho vergonha de ser português, português portuguesinho, portugues sentado no canto e acomodado, superior apenas nas palavras e na dor de cotovelo, sentado à espera que a fama e a fortuna me venham parar às mão sem fazer nada por isso, apenas porque sou mais esperto que eles, porque conheço aquele e o outro, porque me vou safando e os outros que se lixem.

não tenho moral para apregoar estas palavras ao vento, sou apenas um jovem cheio de força de vontade e boas intenções, triste de ver para onde caminha o meu país e não ver ninguem a fazer nada por ele. ora ganhamos nós, ora ganham eles, ora metemos nós no nosso ora metem eles no deles e os outros que se lixem.

tão molengas somos que nem em máfias nos organizamos, pequenos furtos aqui ali, nada de grandezas que só dão problemas. depois te dirão 'eu não te avisei' e tu dirás 'pois, tinhas razão'.

e eu vos peço a vós portugueses não conformados que se levantem e não avisem ninguem, ouçam os conselhos dos outros mas deem-lhes a importância que merecem, não mais. sejam por vós próprios não andem a reboque dos outros. caguem nas modas e nos dizeres de conveniencia, no lucro facil e no sofá mole.

não direi 'ainda bem que não te dei ouvidos' pois não é vingança que procuro, é sentir-me bem comigo mesmo e isso sinto mesmo que falhe e que ouça 'eu não te disse' porque tentei, dei a cara, apanhei mas levanto-me e volto à luta, porque parar é morrer e é a errar que vou aprender.


aos que vivem à conta do estado, de não pagarem impostos, de máfias, manhas e esquemas, aos que se aproveitam, aos que se deixam aproveitar e se calam, e aos que se não fazendo nada, se algum dia fizerem alguma coisa é uma das anteriores eu vos peço para pararem para pensar e vos mando à merda.

a todos os Velhos do Restelo